segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Tesouro

Acontece com todo mundo.
Você passa milênios buscando algo. Vidas seguidas de suor e dedicação. Almeja, idealiza, mentaliza, sonha.
Um dia, depois de vários alarmes falsos e decepções, você finalmente encontra!
Depois de tanta dificuldade, coragem e determinação, é seu tesouro, sua pedra preciosa, a pura imagem da sua alma feita matéria.
Você comemora, sente um êxtase infinito, curte, curte muito... Até que, com o tempo, as coisas mudam.
Seja por um medo inexplicável de perder o que conquistou com tanto custo, seja porque nada é suficiente para o ser humano e precisamos ir ao encontro do próximo sonho, seja porque nos sentimos fragilizados diante de um objeto que exerce tanta força sobre nós... quem sabe... mas mudamos.
Em algum momento enterramos o tesouro. Afinal, tesouro não é tesouro neste mundo pós-lemuriano se não estiver enterrado ou no fundo do mar...
Passamos então a sonhá-lo novamente por não mais vivê-lo... fica inacessível por nossa própria escolha, pela sua segurança, pela segurança dele... Tanta burrice...
E você vai vivendo uma vidinha mediocremente feliz ou aceitavelmente triste, até que um dia, o Universo te dá uma chacolhada por qualquer motivo; você acorda com uma cisma qualquer e tem uma vontade estranha de olhar para ele. Volta seus olhos para as entranhas do seu submundo... E seu mundo cai...

A bela pedra iluminada não é a mesma. Inexplicavelmente, está trincada, ou sem brilho, e você surta.
Como, como pode ter sido se a guardei tanto, se a protegi, se a escondi de qualquer um que pudesse tocá-la, roubá-la ou machucá-la? Até de mim mesma?
Á partir deste trauma sem precedentes, a única coisa que nos passa à mente é consertá-la, então. E sua vida não tem outro motivo maior...
Mas a cada tentativa de curá-la, você assiste desesperada que a situação piora a olhos vistos; sua querida pedra parece não querer ajudar. Quanto mais faz, mais estraga seu belo tesouro, sem nada poder fazer ao contrário...
Até que, em um momento horrível que você nunca desejou viver, ele se rompe totalmente. Despedaça-se completamente nas suas mãos, se transformando em pó, voltando ao que fora um dia... uma lembrança perdida , uma imagem bela e longínqua.
Desespero. Indignação. Revolta. Dor.
Fracasso. Desânimo. Culpa. Tristeza infinita. Sem saída.
Mas o mundo - ainda bem - é cíclico, e não linear. O último ponto de uma estrada conhecida sempre termina no primeiro da próxima a se desvendar.
Um dia você se conforma. Levanta da cama, olha o sol de manhã e diz que sorrirá novamente. Tudo bem, afinal aquele tal tesouro não ERA VOCÊ, ele ERA SEU. E você pode continuar. Existirão outros (isso você diz para se consolar, porque no início parece sinceramente uma bela mentira...) e volta a desejar sonhar. Acho que é a donzela sonhadora que se torna finalmente, uma mulher real.
E a vida segue. No início você deseja um tesouro exatamente igual. Depois, mais lúcida, começa a aperfeiçoar sua imagem, planejar melhorar sua busca e seus objetivos a conquistar. Vai conquistando também sua maturidade, e isso é muito bom de sentir.
Quando você acredita realmente que superou a perda inestimável, quando se vê andando desenvolta e segura pela nova estrada, quando aprecia novamente a paisagem que se mostra e não lamenta a saudade da antiga, sem querer, tropeça na tal pedra.
Meu Deus, como pode, é exatamente a mesma pedra! Ela havia se transformado em pó! Eu não estava procurando mais por ela...
Passado o susto, o questionamento, você se entrega à uma total e maravilhosa sensação de bem-estar pela conquista surpreendente. Desta vez ela não foi fruto de uma busca frenética. Você não revirou céu e mar para encontrá-la, não abriu mão de coisas importantes por ela, não teve que provar que a merecia. Ela simplesmente...te encontrou.
E uma paz enorme te invade. E a gratidão te consome e transborda da sua alma. E a luz aquece seu espírito. E seu corpo se entorpece de puro prazer...
E só então percebe. Ela não está exatamente igual. É a mesma pedra, mas parece mais transparente, mais brilhante, reluz diferente. Parece que aprendeu a iluminar de outra forma, tem outro sentido...
Acolhendo ela ao peito, com toda a alegria que uma pessoa poderia sentir, você se dá conta que também se tornou outra pessoa, e uma bela surpresa abre portas na sua mente. A antiga menina havia se quebrado com a pedra perdida, havia se transformado em pó, e você nem ao menos havia notado... A pedra se quebrando havia levado tudo o que a prendia a ela, os medos, as dores, os apegos, as ilusões... Ela a havia elevado, mesmo quando a levou ao chão. Enquanto você se reinventava à partir do que havia restado, havia sido a luz dela, ou a luz que dentro de você se comunicava com ela, que a guiou, sem perceber, ao seu auge de mulher.
No dia que sua alma se encontrou, no dia que renasceu, no dia que se reinventou...ela pôde, então, existir novamente. Mas como você, ela nunca mais será igual... Novamente... ainda bem.
Sua cabeça imediatamente aprende a respeitar seu coração, e aceita seus conselhos e sua voz de uma forma que nunca havia conseguido fazer. Escuta claramente o que ele diz. Nunca mais guardar tesouros! Nunca esperar para ser feliz! Nunca mais agir por medo ou por busca de ilusões!
Com a sabedoria da grande anciã que acaba de brotar da sua velha alma, confecciona com carinho e paciência, um belo e garboso colar com sua pedra iluminada. Coloca-a ao colo, exibindo junto ao seu peito todo o seu feito e conquista de Luz, sem medo, apego ou vaidade vazia. Afinal, tesouro é para se usar!
Junto à seu peito, a cada dia ela é mais bela, e te faz mais feliz, fazendo circular uma roda que não pára de verter alegria e êxtase em cada um dos seus dias...
Está aprendida a lição. Está pronta para a próxima, que será mais fácil, pois sabedoria acumula e facilita a estrada.

Acontece com todo mundo. Aconteceu comigo.

Você passa milênios buscando algo. Vidas seguidas de dedicação e suor. Almeja, idealiza, mentaliza, sonha.
Um dia, depois de vários alarmes falsos e decepções, você finalmente encontra! Uma carreira, uma resposta, um sentido, uma conclusão, uma conquista, uma superação.
No meu caso, foi um grande e verdadeiro amor...
E depois de tudo vivido, sentido, superado, resolvido, percebe que nada neste mundo pode realmente ser levado, ou destruído, se reside, de verdade, dentro do seu mais puro e verdadeiro sentimento da alma. Ali, é o único lugar seguro para um tesouro tão caro...
E que brilhar, faz parte de cada um de nós. Não ofusca. Só inspira quem olhar.
Isso faz nossa fé valer a pena. Mais ainda.
Ainda bem.
E seguimos nós, rodando...na pura roda da vida.