domingo, 24 de julho de 2016

Buscas... e encontros


Buscar, buscar, buscar...

Todos buscam algo por este planeta, isto é fato, mesmo que não saibamos direito o quê. E a caminhada é tão exaustiva às vezes, que, quando encontramos mais um pedaço do quebra-cabeça em algum ponto, faz um bem danado... ah, faz.
Ontem passei por um momento mágico.
Daqueles que vêm embalados em lembranças e memórias e dizem com clareza e carinho o que precisamos confirmar dentro da alma sobre nós mesmos. Fez bem. Foi um encontro.
Mas para compartilhar, preciso voltar nos anos e nas ideias.

Eu nunca entendi uma "busca espiritual". A ideia de buscar espiritualidade era como buscar algo fora que tinha certeza já estar dentro de mim, não fazia sentido algum. Sempre foi assim..

Fui criada numa família muito eclética e "buscadora" espiritualmente, tinha contato com várias religiões e culturas, e estas "conversas" na minha casa, durante a infância e adolescência eram diárias.
Leituras, rodas, discussões. Sou muito grata pela oferta de informações que isso me proporcionou, mas sinceramente, eu não me atraía muito por nada realmente naquela época, a não ser alguns fatos interessantes sobre a vida de algumas pessoas consideradas "Mestres" de alguma forma, e detalhes sobre suas jornadas na Terra.
O que me chamava atenção em tudo aquilo não eram os sonhos, os milagres, as visões, as intuições que deslumbravam todos... isso para mim parecia muito natural, uma conexão com o Sagrado, a Essência que todos temos. As tais teorias sobre Deus e o Universo, que tanto prendiam as pessoas, nunca me foram tão interessantes. 
Meu interesse era exatamente na parte que não focavam tanto... em suas vidas pessoais, escolhas e vivências, em como lidavam com cada passo de suas vidas terrenas apesar dos fatos sagrados que aconteciam pelo caminho. 
Através das vidas destas pessoas consideradas especiais, todos procuravam explicar Deus de tantas maneiras, desesperadamente, mas afinal, em todas as caminhadas, o tal "Deus" estava sempre dentro... então como encontrá-lo em outra pessoa? 
Nem preciso dizer o quanto isso me trouxe problemas, o quanto fui chamada de "rebelde", "arrogante"ou "desrespeitosa" em muitas conversas... Hoje rio muito disso tudo...

E dentro destes caminhos que a vida nos traz, ontem fui à uma experiência muito interessante onde buscadores se encontravam para buscar mais um pedaço de si mesmos, e cada um se voltava para dentro, na tentativa de sair do ego e alcançar a essência de tudo.
Ali, na egrégora de Luz formada, chamei a mim mesma. Fiquei calma pensando em minha jornada, meus próprios questionamentos, e lembrei docemente do momento em que encontrei o "algo" que colocou o Sagrado em palavras, finalmente, para mim.
Acho que todos nós já tivemos, ou ainda teremos este momento mágico. É realmente libertador.

Entre todos os que cantavam e meditavam, lembrei de quando nada que me era oferecido como leitura sagrada, ou filosofia oculta, encontrava eco dentro de mim, e eu nunca havia me importado com isso de verdade.
Não tinha vontade de me aprofundar em nada, em linha alguma, e não o fiz. Estava tão em Paz no meu "nada" pessoal que tentavam tanto preencher com "algo maior", e só procurava uma forma de traduzir isso para ser compreendida.
Eu tinha dezesseis anos., cursava o terceiro ano colegial. No meio da aula de literatura, escutei algo que me libertou. Era um poema de Fernando Pessoa, no heterônimo de Alberto Caeiro.
Maravilhoso como sempre, ele se tornou desde então meu poeta favorito até hoje.
Eu estudava em um colégio de freiras, e minha professora de literatura era uma religiosa. Logicamente ela descreveu o poema como "ateu" e passou para a próxima lição rapidamente... Mas para mim, foi a coisa mais natural e verdadeira que eu havia lido na minha vida.

Eu não consegui mais prestar atenção no resto das aulas, e as palavras de Caeiro ficavam entoando dentro de mim, retumbando todo o meu Ser. Quando eu escutei aquilo, eu ascendi minha visão de mim mesma , uma etapa foi concluída, e parecia que tudo fazia sentido.
Até hoje ele me parece um mantra da verdade, e lágrimas me vem quando o leio... Minha parte preferida:

"Mas se Deus é as flores e as árvores 
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele, 
Então acredito nele a toda a hora, 
E a minha vida é toda uma oração e uma missa, 
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos. 
Mas se Deus é as árvores e as flores 
E os montes e o luar e o sol, 
Para que lhe chamo eu Deus? 
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar; 
Porque, se ele se fez, para eu o ver, 
Sol e luar e flores e árvores e montes, 
Se ele me aparece como sendo árvores e montes 
E luar e sol e flores, 
É que ele quer que eu o conheça 
Como árvores e montes e flores e luar e sol."

Fui buscar todos os versos então... E ao longo deles, Fernando Pessoa definia  Deus e Cristo no seu "Guardador de Rebanhos" de uma forma totalmente inusitada e fora dos padrões, trazendo uma visão alternativa e natural da divindade, e por isso foi criticado pela Igreja e rechaçado pelo público tradicional, limitado e preconceituoso da época.
Para mim foi como cantar em versos a verdade que vivia em mantra no meu ser.
Simples assim, minha tal "busca espiritual" terminou aí, com dezesseis anos, não através de um filósofo, religioso ou místico, mas através de um poeta.

Acredito hoje que seja porque eu sempre havia visto a energia pura da criação em todas as coisas, e me parecia óbvio que o que procuravam sempre esteve li, dentro, fora e ao redor.
Teorias sobre o início e fim de tudo nunca me seduziram, porque a vida inteira é uma prece.
 O mesmo mistério que cria a vida a partir de uma semente ou de um ovo, cria uma galáxia inteira... para mim sempre foi natural e claro. Vida gera vida, em ciclos ininterruptos, e esta energia vibrante que mantém tudo em ordem, fluindo, simplesmente porque é íntegra e pura, porque vai na direção da constância e da harmonia, e está em cada átomo... chamam de Deus. 
Eu chamo esta energia que pulsa em tudo, de Vida. E a Vida com harmonia eu chamo de Amor... ou de Deus. Como quiser.
Vida em desarmonia chamo de Medo. Ou dor.
Pronto. Esta é minha religião. 

A busca findou aos dezesseis, então, você pode me perguntar? Não. 
Depois de muitos anos hoje percebi que minha busca nesta vida nunca foi pela divindade. A Divindade já nasceu comigo, já a encontrei em outras vidas, não há o que buscar dela.
Minha busca que se iniciou aos dezesseis anos foi pela humanidade.
Para mim, ser humano é muito mais difícil que ser Deus. 

Ser Sagrado é fluido, harmonioso. Nossa parte sagrada é amorosa e transparente dentro de nós. Perfeita. É apenas olhar o fluxo, a natureza, e aceitar, e seguir... e você é Divino. Você respeita, você acolhe, você ama, e você é Sagrado. Simples assim... como sempre digo - a Pura Roda da Vida. 
A grande dificuldade é ser matéria. A grande dificuldade é a parte visível e questionável. São as necessidades, as dores, as perdas, os medos e conflitos. Isso é a parte humana que carrega. 

Por isso os Mestres sempre dizem que somos guerreiros. Encontrar a divindade na matéria é um desafio dos mais altos em sacrifício e coragem.
Minha escolha foi mergulhar  nas relações humanas, então... na sombra pessoal e planetária, nos medos e nas dores, para compreender o ser humano, porque Deus eu já sentia.
Mas não pela mente. A mente é insegura e medrosa, limitada ao que pode analisar e julgar. Nunca me pareceu viável entender a humanidade pela mente. A mente liga o humano à matéria, e isso é algo já bem conhecido e compreendido. Meus mestres sempre foram os poetas. Ando através deles e seus cantos sobre a dor e o Amor humanos, e sua canção é no coração e na alma.

A ligação entre humanidade e divindade está no coração. Está nos sentimentos, nas trocas, nas marcas que deixamos no caminho, dentro de nós e dos outros. Nas criações que geramos pela nossa existências, materiais, emocionais e mentais.  
Este caminho não requer celibato, mantras ou grandes carências materiais... ao contrário. É nas relações, nas conversas, nas trocas, no contato com o prazer, com a matéria e com o corpo que o real humano aparece. É aí que ele mora.
É saber tocar o outro e a matéria, e amá-los por escolha, e não por necessidade.
Não se conhece o Sagrado neste planeta se afastando do humano. Os dois precisam se encontrar dentro de cada coração, e este encontro é único.
Nunca o caminho é igual para dois seres, assim como nenhuma árvore é igual a outra, mesmo irmãs de sementes. Tudo ao redor nos molda, e somos particularmente especiais por isso.
Correr o mundo para encontrar Deus e chegar a conclusão de que se é Deus, e só então encontrar o Humano dentro do Deus que se é,  não me parece muito natural, mas é um caminho mental, eu compreendo. e hoje vejo maravilhas que foram alcançadas através dele. Afinal, somos humanos, criativos, temos várias maneiras de fazer qualquer coisa.


Mas para mim, precisei correr pelas pessoas para conhecer o humano que carrega o Deus que já me habitava.
Trazer a divindade já conhecida para o humano desconhecido foi minha busca. Para mim a única coisa certa sempre foi a divindade. O humano sempre foi o mar de dúvidas e sombras a desvendar... não Deus. Aliás, ainda é.
Todos os dias quando estudo, medito, busco e questiono meus Mestres espirituais internos, minha meta é a mesma... fazer o sagrado fluir pelos corpos e mentes de irmãos cansados e esquecidos de quem são.
Os caminhos são os mais diversos, mas ainda bem que existem.
Ontem eu compreendi porque nunca precisei de um guru, mas precisei sempre de amigos...
Não preciso de alguém que seja ponte com minha divindade. Eu a toco desde que nasci. Eu preciso de irmãos e irmãs em busca uníssona por uma humanidade mais sagrada dentro de si mesmos; preciso que sejam ponte para a minha própria humanidade, cantando nossas descobertas e vitórias e encontrando paz em sermos divinos, seja onde estivermos, e ainda assim tocando a matéria.
Minha busca foi minha profissão. Cada pessoa que atendi até hoje, cada ser que compartilhei energia, cada irmã de roda que toquei, foi em parte, um guru, um Mestre para mim. Aprendi um pouco de humanidade em cada uma, e com isso aprendi a respeitar a dor, o medo, a raiva, a mágoa, a dúvida, o sacrifício humano. Aprendi ter compaixão, a ter paciência e respeito pela Sombra e com isso estou mais perto de uni-la à Luz a cada dia.
Só podemos amar quem conhecemos... então me escancarei para o outro. Hoje amo mais ser humana porque amo a humanidade e suas fraquezas e dificuldades. Quando todos sentirem o outro como a si mesmos, e aceitarem o que sentem, mesmo sem compreender, encontraremos a paz. 

Aprendi que somos tão profundos e multifacetados, que julgamentos sobre nós e o outro são impossíveis de serem feitos com justiça neste plano material. Que é por isso que erramos tanto, porque tudo nos leva à ilusão em segundos... mas precisamos nos iludir e desiludir para aprender a ser humanos divinamente. É necessário e está tudo bem em errar, compreender, aceitar e transformar. Então, pulei esta parte de lamentar e culpar, e fui direto para o aceitar e libertar, seja como for.
Hoje acho que estes dois caminhos para a Unidade - sair do humano em busca do divino, ou do divino em busca do humano - são equivalentes e chegam ao mesmo lugar. 
Buscar pelo Pai, ou ser levada pela Mãe... Amar primeiro e depois compreender, compreender primeiro e depois amar... 
Tanto faz.

Qual é o seu, é o que cada coração deve se perguntar. O importante é estar caminhando sempre.
Minha aura se iluminou mais um tiquinho, e fiquei grata por ser quem sou e às minhas irmãs de caminhada que me levaram a mais este passo.
E a todos meus poetas inspiradores do Caminho, tão lindos, profundos e subjetivos, incluindo Yeshua e Madalena, meus cantadores do Amor na Terra...
Eu sou canal de Amor nos corações humanos. É o meu melhor.
Gratidão.