terça-feira, 29 de maio de 2012

Amor



Eu conheci um amor nesta vida. Ou pensei ter encontrado.
Ele nasceu puro e infantil, cresceu, tomou corpo e acordou o espírito. Flutuou com minha alma por caminhos nunca conhecidos, libertou meus medos, sacudiu minhas convicções.
Por ele, deixei de lutar e passei a aceitar. Abri mão de estar certa sempre, concedi a palavra quando queria falar. Amansei a voz em vez de gritar. Por ele esperei, alimentei, insisti, esqueci, abri mão e até desisti. Ele entrou na minha alma devagar (ou terá sido em um terremoto?), transformou o que existia e me fez voltar a sonhar.
Voltei a prestar atenção no olhar, no tom de voz ou na cor da roupa. Lembrei do calor de um abraço fora de hora, de um ombro presente a cada momento, de dividir o cobertor, o sorvete, o carro, o problema, o canal da televisão, os planos da vida, o pacote de pipoca. Lembrei da sensação de abrir mão do que se quer e mesmo assim sentir o calor da felicidade atravessando a alma. Lembrei da sensação de receber, de repente, um olhar apaixonado, uma blusa no frio, um abraço no desânimo, ou de ter sempre um beijo no final do dia, ou um pé encontrando o meu embaixo do edredom no inverno. Lembrei como é maravilhoso estender a mão, mesmo sem olhar para o lado, e sentir outra envolvê-la, sem mistério algum, e andar de mãos dadas, em uma simples calçada. Eu lembrei de como é bom viver a vida em parceria.
O amor envolveu minha alma, e eu simplesmente o tomei como parte de mim.
Mas não era bem assim, pois, um dia, ele se foi.
Assim como muitas coisas se vão, e outras permanecem para sempre, acho que alguns amores têm data para terminar, e outros (que inveja!) permanecem vivos por todas as estações da vida.
Porque amar não é viver sempre na primavera.
O meu amor nasceu em pleno verão, aquecido, forte, estrondoso e avassalador.
Passou por um outono cada vez mais frio e depois se perdeu em meses e meses (ou foram anos?) de um inverno muitas vezes cruel.
Acho que alguns invernos são mais cruéis que outros, afinal. Pois o meu foi longo. E devastador.
Os amores que sobrevivem ao inverno só percebem que ainda vivem quando sentem a neve derreter aos poucos e alcançam a visão tímida do sol (sim, porque mesmo aqui no Brasil, neva nos nossos caminhos e nos nossos corações, em várias fases da nossa vida). Estes sortudos e corajosos amores respiram então, aliviados, o ar fresco e esperançoso da Primavera que começa a nascer nas suas vidas. E em recompensa, a Mãe Natureza lhes dá novas flores, novas chances, novas e belas estradas a seguir. E um tórrido verão para comemorar a dedicação e tanta coragem!
Até chegar o outono brando... e a roda voltar a rodar. Com o tempo ele acostuma, e tira de letra as variações da paisagem e da temperatura. Isso se chama sabedoria. Até amor precisa disto.
O meu amor não pôde ver a primavera chegar. Ele adoeceu de frio, talvez não tenha aquecido o bastante o interior do seu ninho de inverno. Talvez não tenha fechado muito bem as portas e janelas, deixando o frio de fora entrar. Talvez o inverno tenha sido rigoroso demais. Ou o amor, ele mesmo, achando que seria eterno, tenha sido pouco precavido.
Não o escuto respirar (ou será que ouço ainda um tímido suspiro, querendo resistir? Não, acho que não...).
Poucos amores vêem novamente a esplendorosa primavera, pela segunda, ou terceira vez. Poucos se preparam, resistem para alcançá-la.
É preciso aquecer a alma no sol do verão, para resistir ao frio quando chegar (ele sempre vem...). É preciso acreditar, cuidar, para encontrar a luz do sol, novamente, no final de cada ciclo da vida. Mesmo porque não é a intenção que se viva apenas no frio do inverno. É preciso buscar sempre a próxima flor da nova estação, e se renovar na beleza que ela pode trazer. É disso que é feita a história de qualquer amor.
Eu conheci um amor nesta vida, mas ele não foi forte o bastante. Ele me arrebatou, me fez acreditar, envolveu minha fé, minha esperança, minha vontade, transformou minha história, e me deu todas as alegrias do mundo. E o vazio que ele deixa, ao ir, me faz lembrar porque resisti tanto a adotá-lo no meu coração.
E o que aprendi com ele, é que um amor assim, deste tamanho, sempre deixa cicatrizes muito profundas. Marcas que doem, que lembram como surgiram, talvez para nos alertar nos próximos verões em que os corações se permitem esquecer.
Eu não vou esquecer.


Algumas palavras...
A Roda da Vida. As estações. Mudanças, altos e baixos, criações e destruições, chegadas e despedidas. Isso é vida. E às vezes dói.
Não se é evoluído quando se sabe ser feliz sempre. Se evolui quando se consegue sorrir até quando sangra o coração, pois se acredita que tudo é como deve ser. E se espera a próxima primavera.
Momentos tristes são eternas fontes de auto-conhecimento. Os alegres são naturalmente projetados para fora, expandindo a aura e a visão, são para compartilhar.
E assim a roda gira. Para dentro, para fora, inspirando, expirando, pulsando vida a cada respirar.
O segredo está em não prender a respiração. Nem no triste, nem no alegre. Em qualquer um dos dois, pode matar...
Que a natureza nos guie. Como sempre.

2 comentários:

  1. Incrível, teve um momento de minha vida que foi assim.... conheci o verdadeiro amor, intenso e depois... perdi.

    Mas o sentimento é o mesmo até hoje apesar de toda a distancia...

    Hippo

    ResponderExcluir
  2. As vezes quero tanto conversar com vc mais uma vez... Mas a vida segue... Cada um no seu rumo... Mas nada será esquecido!

    ResponderExcluir